Wednesday, June 22, 2005

Era uma vez um menino chamado Elísio

Todos nós em pequenos ouvimos histórias que começavam desta maneira, mas é bem provável que o Elísio não tenha tido alguém que lhe as contasse. Contudo, ele tem a sua própria história que eu vou contar em seguida.
Era uma vez um menino chamado Elísio, que na altura dos acontecimentos tinha somente 15 anos. Era alto e magro com um sorriso esperto mas olhar vazio. As nossas histórias cruzaram-se num dos últimos dias de Outubro de 2002, nos corredores do Tribunal de Família e Menores de Lisboa, ele ía responder por pequenos delitos, entre os quais, apedrejamento a comboios da linha de Sintra e eu era a sua defensora. Recordo várias coisas desse dia, entre as quais o riso de gozo da mãe perante a possibilidade de internamento do filho, a falta de dinheiro para comprar uma sandes ao Elísio que não tinha comido nada durante o dia, mas sobretudo, uma resposta do Elísio à Procuradora do M.P.,
"- Mas que sonhos tens tu Elísio para tua vida futura?"
"- Não tenho sonhos, não sei sonhar."
Senti-me profundamente envergonhada por fazer parte de uma sociedade que permite que um miúdo com 15 anos tenha perdido a sua capacidade de sonhar. E mais do que isso, que poderia fazer eu para alterar nem que fosse um pouco o mundo do Elísio. Nada, eu não podia fazer nada, mas no final do dia quando nos despedimos, agarrei-o pelo braço e obriguei-o olhar-me nos olhos e disse-lhe que acreditava que ele poderia ser uma pessoa melhor, que ele já tinha muito valor apenas tinha de o descobrir.
A história do Elísio é só uma entre as muitas que temos assistido nos últimos dias nos meios de comunicação. Não estou, de forma alguma, a desculpar este tipo de criminalidade e achar que devemos ser tolerantes e deixar que a impunidade prevaleça, com receio que a resposta política possa ser considerada racista ou xenófoba. Apenas defendo que além do castigo se deve ir ao fundo do problema social, e fazer com que estes miúdos acreditem mais no seu valor, demonstrando-lhes que podem ser heróis sem que para tal tenham de enveredar pelos caminhos mais fáceis, que são também os mais falaciosos.
A pergunta que eu deixo a quem me possa eventualmente ler, foi escrita pelo Grande Poeta Eugénio de Andrade (no poema que dedicou ao seu afilhado Miguel, no 4.º aniversário deste), Que faremos nós, filho, para que a vida seja mais que cegueira e cobardia?

12 Comments:

< > said...

Já conhecia a história, mas por alguma razão, as palavras que utilizas para escrever deixam-me sempre deliciado. Talvez por escolheres sempre as certas. Continua este blog, que eu quero continuar a lê-lo :-)

*Um Beijão*

9:25 AM  
< > said...

Essa Procuradora do MP já devia ter sido despedida há muito:

1. É uma enorme falta de educação tratar um arguido ou seja quem for por tu num tribunal.

2. Interessa alguma coisa para o apuramento de responsabilidades quais os objectivos de alguém na vida ?

Este nosso sistema penal é totalmente desculpabilizante. É uma vergonha. Em primeiro lugar, há que imediatamente reduzir a idade da imputabilidade penal para 12 anos, pelo menos.

Em segundo lugar, abolir o cúmulo jurídico e a execução de penas. Se são 8 anos são 8 anos. Nem menos um dia. Aproveite-se para abolir os indultos e as amnistias.

E considerando que o povo não tem que ver o dinheiro dos seus impostos gasto devido a quem comete actos tão graves que dão lugar a pena de prisão, quem for preso tem que pagar a estadia na prisão dê por onde der. É uma total injustiça para com o povo que cumpre as leis que assim não o seja.

Infelizmente, insiste-se na ideia de que os coitadinhos são os presos, muito a reboque dos marxistas.
Coitado é o povo. Os presos só têm o que merecem, e têm pouco para o que deviam sofrer.

Deixemo-nos de sensibilidades ridículas. Ter pena não leva ninguém a lado nenhum. É necessário um sistema penal duríssimo e frio. Não um como o nosso que toma acessos emocionais por atenuantes.

O que é preciso é frieza e dureza, e não sensibilidade. A sensibilidade é uma característica dos fracos.

E se o Elísio não sabe sonhar, é apenas e só um problema ou uma vantagem dele, conforme queiramos. Ninguém tem nada a ver com isso.

Até acho que é uma vantagem. Sonhar para quê ? Isso leva alguém a algum lado ? Apenas distrai da vida concreta. E isso não é bom.

Infelizmente, a nossa sociedade valoriza até às últimas os sonhos e as emoções. É triste. Até há um cientista, curiosamente português, que tem a distintíssima lata de subverter tudo quanto é bases da ciência promovendo emoções como algo essencial ao homem.

Em lugar de seguir a via justa e perfeita e procurar a razão, prefere mentir descaradamente e inventar provas científicas que satisfazem as Oprahs Winfreys deste mundo.

Assim não vamos lá.

PS - Infelizmente o nosso sistema não permite que o arguido em questão fosse punido devidamente. O que ele fez merecia pelo menos uns 15 anos de prisão.

Deixemo-nos de tretas. Pensar que a pena serve para reinserção social é dos maiores embustes. A pena tem apenas uma função punitiva, ponto final. Deixemo-nos do politicamente correcto.

1:14 AM  
< > said...

Ainda bem que existem pessoas com tantas certezas como tu, isso tem feito o mundo ir para a frente de uma forma inacreditável justa e honesta para todos nós.

5:34 AM  
< > said...

"Assim não vamos lá"

Pois, muito provavelmente só vamos para a frente com o pensamento fascista de ignorar a capacidade do ser humano de ser emocional e de sonhar. Claro que o país não está nada bem, mas acreditar sinceramente que a solução para a falta de cinzentismo que atravessa Portugal é deixar emoções de lado e tornar todo o sistema penal numa engranagem fria e impiedosa. Eu cá não percebo minimamente de leis ou do sistema penal, mas parece-me que estás a ignorar a função-base da ideia de prisão: a de castigar, é certo, mas também a de reabilitar o cidadão. Isso com certeza não será conseguido obrigando-o a pagar a sua estadia na prisão, e muito menos recusando-lhe qualquer hipótese de redução de pena. Mas pronto, como disse, eu não compreendo nada do assunto e tu pareces ter as ideias mais que definidas, ainda que, em minha opinião, mais atrasadas do que o 39 que passa aqui no Porto.

5:38 AM  
< > said...

As pessoas se fazem as coisas é porque querem. E apenas e só devido à sua própria vontade.

Reabilitação do comportamento das pessoas cheira a Sibérias, fora isso. É uma ideia muito derivada dos ridículos pensamentos do homem novo marxista.

Quem comete crimes é porque quer, ponto final. E deve ser severamente punido por isso.

E então o que seria honesto no avançar do mundo ? Andarmos todos para trás não sei quantos anos só para as pessoas no 3º Mundo não morrerem à fome ? Tenham paciência, que esse é um problema deles e não nosso.

Para concluir: atrasadas ? Então o que é adiantado ? Perdoar sempre porque o que é bom é ser bonzinho, levar estalos e dar a outra face ?
Lamento. Isso são atitudes de quem não se dá ao respeito.

9:01 AM  
< > said...

Seguindo esse raciocínio, nem sei porque raio há tribunais, ou se manda gente para a cadeia. Se a cadeia não serve para reabilitar, então é logo para a fogueira com os criminosos, não? Esse tipo de pensamento não só é exageradamente perigoso como roça o ridículo de uma forma absolutamente hilariante.

Mas mais hilariante ainda é pensar-se que alguém com 12 anos rouba porque quer, sem olhar sequer às causas que o levam a fazê-lo. Esse pensamento é consequência de quem nasce a mamar uma chupeta de ouro. Quanto ao terceiro mundo, claro que o problema é deles, e por isso muitos de nós nos sentimos levados a ajudá-los. É que é de uma arrogância enorme ter a sorte de se nascer com as mínimas condições de vida e depois virar as costas a quem não tem nada, excepto quando é hora de lhes explorar os recursos naturais, porque aí o terceiro mundo já é mais do que bem vindo.

E tenho dito :-D

9:34 AM  
< > said...

Errado.

1. O direito à vida está consagrado, e ainda bem.

2. As pessoas são presas por duas razões: porque a sua presença em liberdade envolve perigo para a comunidade e como punição pelo que fizeram.

3. Mas alguém tem a ilusão de que alguém com 12 anos não sabe que matar e roubar é proibido ? Inimputabilidade em termos abstractos que eu saiba significa que a pessoa não tem noção de que as coisas são ilegais. O que manifestamente não é o caso.

4. Cá está o pensamento desculpabilizante. De que é que interessam as causas se o prejuízo social é o mesmo ? Para além disso, as pessoas sabem o que fazem.

E mais, se há coisa que devia ser incentivada nas escolas é o ORGULHO. Pessoa com orgulho prefere morrer de pé que viver de joelhos. Pessoa com orgulho não rouba. Pessoa com orgulho não pede.

5. Claro, claro, depois da restante argumentação até me admirava se não viesse o argumento de que os exploramos. É que isso não é verdade. E fora isso, já que acham que são explorados, estão à espera de quê para nacionalizarem essas actividades ?

É evidente que o Paulo não tem o menor conhecimento da realidade relativa ao 3º Mundo. Porque a realidade é esta e só esta: dirigentes que querem literalmente viver às custas dos países mais ricos, sem mexerem um dedo pelo desenvolvimento. A isto chama-se parasitismo.

Para além disso, os países têm a sua independência. Cada um tem os seus próprios problemas para tratar (sem prejuízo da existência de espaços como a União Europeia, em relação ao qual já por várias vezes me pronunciei favorável a vários alargamentos, ainda que isso signifique que Portugal passe a ser contribuinte líquido).
Esses Estados resolvam os seus próprios problemas tal como nós resolvemos os nossos.

O que é inaceitável é este paternalismo (que eu diria que é o colonialismo do séc. XXI em versão politicamente correcta) de que temos que os andar a sustentar "a bem deles".

6. Se há coisa que tem acontecido é o mundo ir para a frente. E de forma mais que honesta, designadamente tendo em conta que quase tudo se deve aos avanços científicos.
Se é justa, estou certo que sim. Ou estavam à espera que as pessoas andassem a pensar nos outros e não em si próprias ?

1:14 AM  
< > said...

Isto mais não é do que uma questão de opinião, a qual me vejo obrigado a respeitar, mas de forma alguma a concordar. Achar que aos 12 anos um miúdo tem de ter a noção do que é bom ou mau sem olhar a contextos sociais é algo que não me cabe na cabeça, assim como não me cabe na cabeça que se ignore o facto de que muitos países terceiro mundistas vivem em condições bastante precárias, muitas vezes directa ou indirectamente devido à intervenção europeia ou dos paises ditos desenvolvidos. Teres falado em colonialismo até veio a calhar. Não que não concorde com alguns pontos de vista que mencionas, mas acho que os simplificas de mais. Só assim se explica que uma simples opinião faça de mim um, e passo a citar, "homem novo marxista". Lá deves saber do que estás a falar, e não sou eu quem te vai contrariar (ena, rimou).

5:04 AM  
< > said...

O que é bom ou mau não se discute, porque isso depende de cada um. Cada um tem o direito inalienável de fazer as suas avaliações.

Mas é fazer figura de avestruz pensar que pessoas de 12 anos não sabem que pelo menos uma boa quantidade de factos tipificados como crime são proibidos.

5:34 AM  
< > said...

Poucas são as palavras que arranjo para comentar esta história. É algo tocante que nos faz realmente pensar. Muitas vezes as instituições não se preocupam realmente em educar estas pessoas, só as querem culpar de coisas que eles pensem que não têm desculpa. Felizmente no sistema judicial português ainda há pessoas como tu, que pensar nos arguidos e acham que eles podem ter um futuro melhor.

Bjs
Miguel

5:00 AM  
< > said...

Os arguidos têm que ser punidos e ponto final.

Não são coitadinhos, são pessoas responsáveis pelos seus actos. Actos criminosos não podem ter desculpa.

Estamos a tirar recursos dos cidadãos que cumprem as leis para gastar com quem não as cumpre ? Isso é uma brutal injustiça e o povo não merece isso !

Só falta virem dizer que são vítimas. Não quero saber. Muita gente vive em condições iguais e piores e não rouba nem destrói.

9:50 AM  
< > said...

Mais. O Estado não tem nada a ver com o futuro das pessoas. Assegura-lhes direitos.

De resto, cada um é que tem que tratar da sua vida. Cada um faz da sua vida o que quer. Se comete crimes, obviamente sofrerá as consequências.

9:50 AM  

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