Saturday, August 05, 2006

Leituras XI


Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
RICARDO REIS
Dissertar sobre uma obra de José Saramago é uma tarefa árdua e que não está ao alcance de todos, e eu não creio ser uma excepção, e, por isso mesmo, confesso aqui a minha falta de engenho para comentar um livro complexo e denso no seu conteúdo, como o é O Ano da Morte de Ricardo Reis. Como se tal não fosse suficiente, tem este livro como "personagem principal" um dos heterónimos mais completo e labiríntico criado por Fernado Pessoa. E mesmo não sendo - infelizmente - uma conhecedora profunda de Fernando Pessoa, nem dos seus heterónimos, não pude deixar de me deparar ao longo da leitura com citações à obra de Ricardo Reis, e até do próprio Fernando Pessoa. Citações essas que aparecem interligadas com referências históricas, labirintos ficcionais e personagens com características muito próprias, ora, juntando todos estes aspectos literários temos como resultado, sem dúvida, uma grande obra de um grande escritor.
Ricardo Reis regressa a um Portugal que se auto-denomina de Estado Novo, e é neste romance o verdadeiro "The God of Labyrinth" (título do livro que acompanha Ricardo Reis), procurando identificar-se por um lado, e escapar dessa identidade por outro lado.
"Ricardo Reis faz um gesto com as mãos, tacteia o ar cinzento, depois, mal distinguindo as palavras que vai traçando no papel, escreve. Aos deuses peço só que me concedam o nada lhes pedir, e tendo escrito não soube que mais sizer, há ocasiões assim, acreditamos na importância do que dissemos ou escrevemos até um certo ponto, apenas porque não foi possível calar os sons ou apagar os traços, mas entra-nos no corpo a tentação de mudez, a fascinação da imobilidade, estar como estão os deuses, calados e quietos, assistindo apenas."