O que nos vai na alma
No entanto às vezes, muito de vez em quando, há canções, livros, filmes e fotografias que exprimem o que somos na perfeição. E não o fazem necessariamente por palavras ou por imagens; a associação é muito menos directa e mais complicada do que isso. Quando estava começar a escrever a sério, li Dinner at the Homestick Restaurant, de Anne Tyler, e de repente compreendi o que era, e o que queria ser, desse por onde desse. Trata-se de um processo semelhante ao da paixão. Não escolhemos necessariamente a melhor pessoa, nem a mais sensata, nem mais bonita; há um processo diferente a decorrer. Havia uma parte de mim que preferia ter optado por Updike, Kerouac, ou DeLillo - alguém do sexo masculino, pelo menos, possivelmente alguém um pouco mais opaco, e certamente alguém que dissesse mais palavrões - e embora tenha sentido admiração por esses escritores em diversos períodos da minha vida, a admiração é uma coisa muito diferente da que estou a falar. Estou a falar como se entendesse - ou pelo menos a sentir que entendo - todas as decisões artistícas, todos os impulsos, a alma tanto da obra como do seu criador. "Isto sou eu" foi o que me apeteceu dizer quando li o romance rico, triste e adorável de Tyler. "Eu não sou um personagem, não tenho nada a ver com autora nem passei pelas experiências de que ela fala. Mas mesmo assim, é assim que me sinto por dentro. Era assim que a minha voz soaria, se eu algum dia encontrasse uma voz."E acabei por encontrar uma voz, e ela era a minha e não a dela; mas apesar de tudo, o processo de identificação era tão forte que ainda não sinto que me tenha conseguido exprimir assim tão bem, de uma maneira tão completa, como Tyler exprimiu o que me ia na alma naquela altura.
NICK HORNBY in 31 Canções
2 Comments:
Este Hornby é o maior. Quero dizer, se calhar é melhor para mim dizer que é só o segundo maior, depois da mademoiselle MM.... :-P
Parece-me bem ;)
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